Discurso da deputada Janete Capiberibe – INCRA – CAINDR – 09/06/2010
Senhor Presidente deputado Valtenir Pereira;
Senhores parlamentares;
Senhor Gilmar do Amaral, presidente da Associação Nacional dos Engenheiros Agrônomos do INCRA;
Senhoras e senhores servidores;
Desde o início da década de 90, a filosofia neoliberal esmerou-se em desqualificar o serviço e os servidores públicos. Até 2002, os governos federais comportaram-se conforme esta ideologia instituindo programas de demissão voluntária, achatamento salarial, terceirização, apagão completo de concursos públicos. Grande parte das categorias do serviço público passou uma década sem qualquer política de recuperação salarial.
O atual governo andou no caminho oposto dos seus antecessores. Promoveu sensível melhora na qualidade dos serviços públicos e o país enfrentou a última crise mundial com tranquilidade, em grande parte por conta dos investimentos públicos de um lado e pela seriedade com que conduz a administração pública de outro. A aprovação do presidente Lula pela população brasileira é outro bom sinal.
O serviço e os servidores públicos foram e estão sendo foco de políticas de aperfeiçoamento e valorização.
Esta mudança na elaboração e implantação das políticas públicas, com o viés da inclusão social, me dá orgulho de ser da base do governo.
Mas, quando nos reunimos para uma audiência pública como a de hoje, nos damos conta do quanto é preciso reorganizar no poder público, procurando reduzir a influência dos vícios, dos privilégios, dos preconceitos e dos tabus que permeiam a história brasileira.
O que justifica que as remunerações pagas a um engenheiro servidor público federal tenham diferenças tão discrepantes e tão absurdas entre os três poderes ou, pior ainda, dentro de um mesmo poder federal?
Ainda mais quando as funções que são típicas de Estado sejam as mais prejudicadas, revelando uma incoerência preocupante por que poderá resultar, num futuro não muito distante, no completo desmonte dos órgãos cujos servidores são alijados da diretriz que norteia as políticas públicas das demais categorias às quais se assemelham.
Soluções demasiadamente segmentadas e alienadas do conjunto do serviço público federal apenas agravam as distorções e as injustiças. E tenho visto nas manifestações do presidente da República que não é da sua vontade e da sua história política repetí-las ou reproduzi-las.
Temos aqui um caso concreto do agravamento de uma injustiça, na carreira dos engenheiros agrônomos peritos federais agrários que, ao que parece, não foi alcançada pelo esforço de governo como foram a dos engenheiros agrônomos da Polícia Federal, do MAPA, do Ministério Público da União e do DNIT, para citar alguns.
Não há dúvida que estas categorias são merecedoras!
Com certeza fazem jus ao plano de carreira que apresentaram e que foi bancado pelo Governo Federal.
Cabe perguntar por que os engenheiros do INCRA não merecem igual tratamento pelo Ministério do Planejamento?
O achatamento salarial que os Peritos Federais Agrários do INCRA têm sofrido quando comparados aos seus colegas de outros órgãos federais, ou quando comparados aos Fiscais Federais Agropecuários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, de onde são oriundos, é assustador.
A remuneração dos Engenheiros Peritos do INCRA é apenas 40% do valor recebido pelos Engenheiros Fiscais, do MAPA.
Esta injustiça provoca prejuízos graves às políticas públicas do atual governo, ou de qualquer governo, já que as atribuições do Perito Federal Agrário são exclusivas do Estado.
É preocupante que sejam achatados os salários dos servidores responsáveis pelos laudos do programa Terra Legal, da Amazônia, das demarcações das terras quilombolas, da desintrusão das terras indígenas; responsáveis por fiscalizar a determinação constitucional da função social da terra e pela execução de políticas de valorização e fortalecimento da agricultura familiar.
Estes segmentos são a ponta mais fraca no secular embate pela posse e ocupação das terras brasileiras e, sem qualquer dúvida, precisam da ação permanente de um Estado forte para que seja garantido o mínimo respeito aos seus direitos constitucionais, à ocupação das suas terras e à garantia dos meios para sua produção e sua renda.
Estes servidores do INCRA são o Estado brasileiro, lá na ponta, na execução das obrigações legais e constitucionais do Estado.
A não ser que, ao não lhe dar o tratamento merecido e idêntico às demais categorias assemelhadas, o estado brasileiro queira transparecer que está abrindo mão do seu papel constitucional, o que não quero crer.
Como garantir a valorização e o fortalecimento da agricultura familiar, onde está a produção massiva dos alimentos que vão à mesa dos brasileiros e mais de 70% dos empregos na agricultura? Onde se produz muito com proporcionalmente menos área de terra e menos financiamento público?
Como garantir a execução do Terra Legal? Como garantir o direito das comunidades quilombolas às suas terras com os agentes do Estado – que são o Estado no cumprimento das suas atribuições, repito – FRAGILIZADOS?
Há um contraste ofuscante com as carreiras que visam a promoção do agronegócio e, para mim, parlamentar da base do governo, essa diferença salarial gritante destoa das políticas executadas pelo Governo Federal.
A distorção salarial tende a se agravar com a aprovação do Projeto de Lei nº 5.920, de 2009, em que Técnicos de Nível Médio do Ministério da Agricultura passarão a receber salários 20% maiores que os dos Peritos Federais Agrários, profissionais de nível superior. Certamente, os técnicos fazem por merecer tal reajuste, mas é justo que os Peritos tenham considerada sua carreira, escolaridade e as atribuições diferenciadas que lhes são incumbidas.
Mais de 60 Peritos Federais Agrários, muitos com pós-graduação, ingressados pelos concursos públicos de 2004 e 2005, já deixaram o INCRA. Cerca de 25% dos que ingressaram no último concurso deixaram o INCRA. Outros 30% se aposentarão em breve. E, no cenário atual, não há atrativo para recompor o quadro de servidores.
Por este caminho, se o Governo não der tratamento adequado à carreira de Perito Federal Agrário, o INCRA não terá quadro profissional estável e qualificado.
O senhor Rolf Hackbart, presidente do INCRA, corre o risco, e me permita o exagero, de presidir um órgão sem servidores, sem estrutura e sem capacidade técnica para cumprir suas funções. Não terá justificada sua existência.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário corre o risco de apequenar-se e, aos poucos, deixar de existir para atender à agricultura familiar e à política de reforma agrária, fundamentais para a justiça social não apenas no campo, mas para toda a sociedade brasileira.
A se repetir o equívoco recente, o poder público ficará fragilizado para desempenhar a fiscalização agrária, a regularização fundiária, o reconhecimento das comunidades quilombolas e, especialmente, a reforma agrária, fundamental para democratizar o acesso à terra, à cidadania, aos direitos políticos e à riqueza, no país onde a história nos cobra uma profunda reforma estrutural com vistas a reduzir a concentração de renda e de poder.
É fundamental, portanto, que o Governo Lula, que já instituiu políticas concretas para valorizar os servidores, para fortalecer e aperfeiçoar os serviços públicos e para elevar a dignidade dos cidadãos que são o motivo pelo qual o Estado e o poder público existem, promova, agora, a correção desta injustiça, reduzindo essa discrepância salarial que, em breve, causará a fragilidade do poder e dos serviços públicos prejudicando, principalmente, o cidadão contribuinte.
Os servidores do INCRA têm no meu mandato, nesta parlamentar uma aliada nesta mobilização que não é uma simples e justa reivindicação salarial. É a proteção dos mecanismos do Estado brasileiro para a justiça, a garantia de direitos, a produção e a distribuição de renda no campo brasileiro.
Não vejo como o Governo Lula poderia se omitir.
Muito obrigada.
Deputada federal Janete Capiberibe – PSB/AP